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6 min — há 4 anos — Atualizado em: 2/9/2021, 8:25:06 PM
Escrevi alguns artigos sobre tumores de estimação, fixações obscurantistas de parte da opinião nacional, frutos de décadas de propaganda enganosa, que repercutem nas instituições de ensino, imprensa, legislação e, consequentemente, nas políticas de Estado. Os temas enganosamente trabalhados viram xodós dos bem-pensantes, ícones do politicamente correto. Acabam como crenças enraizadas e muito generalizadas que dão origem a credulidades — metástases que tomam o organismo. São tumores de estimação. Infeccionam tudo, a política, as normas vigentes, a economia. Em geral, feitas as contas, representam crueldade para todos, em especial sofrem os mais desassistidos. É o caso da reforma agrária, tumor de estimação, fator de pobreza e atraso. A embusteirice pelo estatismo é outra.
Desde os anos 50 a reforma agrária vem sendo alardeada como panaceia para os problemas do campo. Ao ser imposta, invariavelmente traz produtividade baixíssima, a produção, quando há, pequena e instável, vira foco de roubalheira e trambiques, poço sem fundo onde se joga irresponsavelmente dinheiro público, bem como ocasião de brigas, ilegalidades e demagogia comunista. Em duas palavras, estimula a desordem no agro e agrava a pobreza. É só visitar os assentamentos [chamados por tantos e com razão de favelas rurais] Brasil afora. Há relatório do TCU a respeito, estudos sérios de especialistas, não vou aqui tratar deles.
Por que empreguei pústulas diletas? Arranjei outra expressão, foi só para não repetir tumores de estimação, usada anteriormente. Mas é a mesma coisa, são morbidezes que intoxicam a imprensa, o mundo político, a legislação. Ninguém mexe nelas, como incompreensivelmente alguns doentes não deixam ninguém tocar nas pústulas. Ficam lá, intactas, diletas, infeccionando o corpo inteiro, sinais precursores da morte.
Tudo isso vem a propósito da notícia informando que o governo Bolsonaro paralisou 413 processos de reforma agrária. A razão, explica em ofício Geraldo Melo Filho, presidente do INCRA, é a falta de recursos orçamentários, cada vez mais escassos. De outro modo, existindo dinheiro em caixa, voltariam as vistorias, o passo inicial; e continuaria a maluquice destruidora da implantação ampla da reforma agrária, com base na legislação vigente. Quase 900 mil quilômetros quadrados, mais que a área somada dos estados de Minas Gerais e Rio Grande do Sul, mais do que utiliza o agronegócio para enriquecer o Brasil, já foram esperdiçados nesse disparate empobrecedor que não cessa nunca. E seus promotores querem mais, mais e mais.
“Nada aprenderam, nada esqueceram”, teria comentado Talleyrand a respeito da nobreza exilada que voltava à França com a derrota de Bonaparte e ascensão de Luís XVIII. Entre nós também a aplicação da reforma parece nada ter ensinado — nada igualmente teriam ensinado os desastres de sua aplicação em outros países. Em mentes misteriosamente refratárias à realidade óbvia, continuam ativos os germes da propaganda enganosa, que nos intoxicam há quase um século. São pústulas deletérias sem dúvida, mas diletas.
A reação natural à paralisação dos tais 413 projetos seria de alívio — hosana, pelo menos a destruição será menor. Geraldo Mello Filho, e aqui ele ecoa opinião difundida em meios oficiais e de divulgação, julgou necessária uma segunda justificativa, como se a primeira — a falta de recursos — que soou como desculpa, não fosse suficiente: “Isso não significa que toda e qualquer vistoria será proibida. Em casos devidamente justificados, fundamentando o caso concreto pela necessidade de interesse público e social, as vistorias seriam autorizadas pela administração central”. Triste; a observação da realidade dantesca da reforma agrária é míope e desfocada; assim dos fatos embaçados e romantizados não nasce o juízo objetivo. Ele brota de opiniões impostas, crenças quase inamovíveis. Resumindo: em ambiente opressivo, escutamos o recitar monótono de mantras e slogans; são preconceitos que alimentam retrocessos.
Também um órgão de expressão, o CNDH (Conselho Nacional dos Direitos Humanos), ligado ao Ministério da Mulher, está querendo saber por qual motivo a reforma agrária está parada. Onde já se viu? Parada? Horror. À vera, os direitos humanos ficariam bem mais protegidos se tal “parada” se prolongasse indefinidamente. Em poucos lugares do Brasil se agridem mais os direitos humanos que nos assentamentos e seu entorno. Perguntem aos infelizes vizinhos deles.
De passagem sustento o óbvio ululante. O lógico e benéfico ao bem comum seria acabar com a reforma agrária assentada na legislação vigente. E ajudar de outra maneira, então efetiva, quem precisar: o Brasil tem muita terra pública, que seja entregue com critério a particulares que queiram e possam trabalhá-la.
Volto ao assunto. É claro, diante de tal situação, não poderia faltar a moxinifada dos partidos de esquerda e de organizações a eles ligadas. Eriçaram-se. A CONTAG (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura) e a CONTRAF (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura Familiar) propuseram no STF uma ADPF (arguição de descumprimento de preceito fundamental). O governo, ao não levar adiante a reforma agrária, estaria descumprindo preceitos constitucionais fundamentais. A ADPF vem com pedido de liminar: anulação do memorando que determina a interrupção do processo de reforma agrária no Brasil. Que se arranje o dinheiro não importa onde, a reforma agrária precisa ser executada sem parar. A ADPF é copatrocinada pelo PT, PSOL, PC do B, PSB e Rede Sustentabilidade.
Não sei que efeito prático terá a tal ADPF. A propósito, tenho repetido a necessidade de reforma — limpeza de entulho — da legislação constitucional e infraconstitucional, envenenada durante décadas por mentalidade totalitária, intervencionista e coletivista. Salvador Allende implantou enérgico programa de comunistização do Chile sem recorrer a legislação nova. Com base em legislação de governos burgueses, “los resquicios legales”, pôde impor sua pauta.
No Brasil, nesse particular, nada mudou nesses dois anos de governo. Infelizmente, não acho que vai mudar proximamente. Os setores dirigentes estão com a cabeça posta, via de regra, em outros problemas. E assim é previsível que continuará intacta a legislação constitucional e infraconstitucional que pode levar o Brasil, sob governo de orientação diferente da atual, a viver situação parecida à da Venezuela. Onde está a cabeça? Por exemplo, temos o espírito tomado pelos despautérios escritos no whatsapp pelo demitido ministro do Turismo que insultou o colega: “Ministro Ramos, o senhor é exemplo de tudo que não quero me tornar na vida, quero chegar ao fim da minha jornada EXATAMENTE como meus pais me ensinaram, LEAL aos meus companheiros e não um traíra como o senhor”. Ou pela formação de grupos para disputar a presidência da Câmara ou do Senado. Problemas emocionantes, superficiais e efêmeros não faltam. O problema que tenho levantado não desperta emoções, não é superficial, não é efêmero. Demanda solução longa e difícil. Contudo, é fundamental caminhar na direção da solução inteira. Resolvido, equiparia o Brasil, por décadas, de condições muito favoráveis ao crescimento na liberdade.
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